quinta-feira, 20 de novembro de 2025

RESENHA - SEDA - Alessandro Barrico


Talvez seja porque a vida, às vezes, se apresenta de maneira tal, que não há mais nada a dizer”


Curtinho e com capítulos que são quase histórias individuais.

Li em três dias. O livro me cativou desde o início.

Com menos de 150 páginas consegue ser extremamente bonito, tocante, bem completo.




"Era o desejo de Hélène, convencida de que a tranquilidade de um refúgio isolado dissolveria o humor melancólico que parecia ter se apossado do marido. Tivera a esperteza, no entanto, de fazê-lo pensar que era um capricho pessoal dela, proporcionando ao homem que amava o prazer de perdoá-lo."


Seda aborda, entre outros temas, o que a falta de comunicação faz com as pessoas.

Obra de Alessandro Baricco, lançado originalmente em italiano, porém li em espanhol.

Publicado pela primeira vez em 1996 saiu no Brasil em 2007 pela Companhia das Letras.



Partiu com oitenta mil francos em ouro e cruzou a fronteira vizinha a Metz, atravessou o Württemberg e a Bavíera, entrou na Áustria, alcançou de trem Viena e Budapeste, e depois prosseguiu até Kiev. Percorreu a cavalo dois mil quilômetros de estepe russa, passou pelos Urais, entrou na Sibéria, viajou por quarenta dias até alcançar o lago Baikal, que as pessoas do lugar chamavam: mar. Desceu o rio Anuir, costeando a fronteira chinesa até o oceano, e, quando chegou ao oceano, deteve-se no porto de Sabirk por onze dias, até que um navio de contrabandistas holandeses o levou ao cabo Teraya, na costa oeste do Japão.”


Parece um exercício de escrita, algo entre um conto, um romance e uma fábula.

Breve e poético, aqui o autor usa a repetição do texto como forma de mostrar a rotina dos personagens.

É uma leitura leve, para quem tem presa e ainda assim, busca algo com certa profundidade.



Comprando e vendendo bichos-da-seda, todo ano Hervé Jouncour ganhava uma quantia suficiente para assegurar a si e à mulher aqueles confortos que na província são considerados luxo. Gozava com discrição de suas posses, e a perspectiva, verossímil, de se tornar rico de fato o deixava completamente indiferente. Era, além disso, um daqueles homens que amam observar a própria vida, julgando imprópria qualquer ambição de vivê-la.”


Citações


Era o ano de 1861. Flaubert escrevia Salammbô, a iluminação elétrica ainda era hipótese, e Abraham Lincoln, do outro lado do oceano, combatia uma guerra cujo fim nunca veria."


"Hélène, como todo ano, ajudou-o, sem nada perguntar, e escondendo sua inquietação. Só na última noite, depois de apagar a luz, encontrou força para lhe dizer

- Prometa-me que voltará.

Com voz firme, sem doçura.

- Prometa-me que voltará.

No escuro, Hervé Joncour respondeu

- Prometo."


Não abra os olhos, e terá minha pele”


Sinopse em português


Uma mistura de romance, conto, fábula e relato de aventura, Seda é a história de um homem que mergulha num universo de mistério, onde vive uma paixão proibida. Mas é, acima de tudo, um livro a respeito de sensações, descritas na prosa ao mesmo tempo concisa e lírica de um dos mais importantes escritores italianos.


É no caráter híbrido, irredutível a classificações imediatas, que reside a riqueza de Seda. A história se desenvolve sobre a trajetória de Hervé Joncour, numa cidade francesa cuja economia floresce, em meados do século XIX, com o incipiente negócio da seda. Nas viagens que faz ao Japão para comprar o produto, descortina-se para ele um mundo a um tempo arcaico e novo, no qual a estranheza se mistura ao fascínio e à paixão.


Seda é um relato de sensações, de como a realidade objetiva se transmuda na visão, na memória e na linguagem. O texto se desenvolve sobre as imagens possíveis do que é puro mistério para Joncour: o fim do mundo, definido como invisível, cores mais leves que o nada, ideogramas que são como cinzas de uma voz queimada<. É em tal poder evocativo das palavras que o protagonista acaba encontrando, já velho e reconciliado com as lembranças, um sentido para a existência. Nesse tempo pouco definível, entre o passado ainda ardente e a melancolia de um futuro pacífico, ele encontra um modo exato de estar no mundo.


Sinopse em espanhol


El autor presentaba la edición italiana de este libro, que tuvo un éxito extraordinario, con estas palabras: Ésta no es una novela. Ni siquiera es un cuento. Ésta es una historia. Empieza con un hombre que atraviesa el mundo, y acaba con un lago que permanece inmóvil, en una jornada de viento. El hombre se llama Hervé Joncour. El lago, no se sabe. Se podría decir que es una historia de amor. Pero si solamente fuera eso, no habría valido la pena contarla. En ella están entremezclados deseos, y dolores, que no tienen un nombre exacto que los designe. Esto es algo muy antiguo. Cuando no se tiene un nombre para decir las cosas, entonces se utilizan historias. No hay mucho más que añadir. Quizá lo mejor sea aclarar que se trata de una historia decimonónica: lo justo para que nadie se espere aviones, lavadoras o psicoanalistas. No los hay. Quizá en otra ocasión.


Sinopse em italiano



La Francia, i viaggi per mare, il profumo dei gelsi a Lavilledieu, i treni a vapore, la voce di Hélène. Hervé Joncour continuò a raccontare la sua vita, come mai, nella sua vita, aveva fatto. "Questo non è un romanzo. E neppure un racconto. Questa è una storia. Inizia con un uomo che attraversa il mondo, e finisce con un lago che se ne sta lì, in una giornata di vento. L'uomo si chiama Hervé Joncour. Il lago non si sa."


Sinopse em francês



Vers 1860, pour sauver les élevages de vers à soie contaminés par une épidémie, Hervé Joncour entreprend quatre expéditions au Japon pour acheter des neufs sains. Entre les monts du Vivarais et le Japon, c'est le choc de deux mondes, une histoire d'amour et de guerre, une alchimie merveilleuse qui tisse le roman de fils impalpables. Des voyages longs et dangereux, des amours impossibles qui se poursuivent sans jamais avoir commencé, des personnages de désirs et de passions, le velours d'une voix, la sacralisation d'un tissu magnifique et sensuel, et la lenteur, la lenteur des saisons et du temps immuable.


Soie, publié en Italie en 1996 et en France en 1997, est devenu en quelques mois un roman culte - succès mérité pour le plus raffiné des jeunes écrivains italiens.


Sinopse em inglês


The author presented the Italian edition of this book by saying: This is not a novel. It is not even a story. It is a history. It begins with a man who travels the world, and finishes with a lake that remains immobile during a day of wind. The man's name is Hervé Joncour, the lake's name is unknown. You could call it a love story, but if it was only this, it would not have been worth telling. The book combines desires and sorrows that have no name, for when there is no name to call things by, you tell stories.




RESENHA - BRAVE NEW WORLD (Admirável Mundo Novo, Aldous Huxley)


Eu reclamo o direito de ser infeliz”



Uma história sobre o preço da liberdade. Uma sociedade onde tudo é banal. Um futuro que pode estar cada vez mais próximo de se tornar realidade. Aqui a dominação vem pelo oposto da violência e a felicidade excessiva é usada para incomodar o leitor.



"comunidade, identidade e estabilidade"



Algumas partes chocantes, ainda mais para a época da publicação (1932), no que diz respeito ao sexo, drogas, os diversos vícios e a religião. Um livro sombrio e filosófico apresentado uma Londres retro futurístico, que cada vez mais se aproxima do nosso presente. O autor teve muita criatividade para compor esse romance em uma época em que a tecnologia estava engatinhando.



" As palavras cantantes vergastaram-no com seu sarcasmo. "Como é bela a humanidade! Oh! admirável mundo novo...!



Foi uma leitura demorada, nada que diminua a qualidade do romance. Realmente um mundo novo, cheio de coisas inacreditáveis. Tem também todos os preconceitos da época, principalmente as representações femininas. De maneira geral, faltou desenvolver melhor os personagens, como a maior parte dos livros do gênero, ele passa mais tempo mostrando vislumbres do futuro - e de como o autor o enxergava-, do que propriamente nos personagens.



"As pessoas são felizes, conseguem o que querem e nunca querem o que não podem ver!"



Ao lado de obras como Fahrenheit 451 de Ray Bradbury, 1984 de George Orwell, que apresentavam governos totalitários de esquerda e de direita, Admirável Mundo Novo vem recheado da crítica afiada e influente mesclando ficção e política.


Todos pertencem a todos”



Com Admirável Mundo Novo acredito que li quase todos os grandes mestres da ficção científica e distopias mais clássicas tais como Aldous Huxley, Philip K. Dick, Margaret Atwood, George Orwell, Ray Bradbury e Anthony Burgess. Todos com obras de grande impacto na cultura pop. Nos próximos meses quero ler algo do H G Wells e Nós, escrito por Iêvgueni Zamiátin.


"O fim é melhor que o meio. Quanto mais roupas se rasgam, mais roupas se compram"



Esse não é o tipo de livro para ler quando jovem, e para ser lido com mais madurez, para entender a sátira, a ficção que flerta com a realidade. Definitivamente é um livro que ressona para fora das páginas, durante e após cada capítulo.



Se tornar os indivíduos felizes é fazê-los amar a sua servidão, a função da planificação consiste em continuar a gerar as condições presentes e futuras dessa felicidade servil.”



CITAÇÕES


"I'm claiming the right to be unhappy"


"O brave new world." By some malice of his memory the Savage found himself repeating Miranda’s words. "O brave new world that has such people in it!".


"But I don't want comfort. I want God, I want poetry, I want real danger, I want freedom, I want goodness. I want sin."


But think of the enormous, immeasurable durations it can give you out of time. Every soma-holiday is a bit of what our ancestors used to call eternity.


That the purpose of life was not the maintenance of well-being, but some intensification and refining of consciousness, some enlargement of knowledge.”



"I know quite well that one needs ridiculous, mad situations like that; one can't write really well about anything else. Why was that old fellow such a marvellous propaganda technician? Because he had so many insane, excruciating things to get excited about. You've got to be hurt and upset; otherwise you can't think of the really good, penetrating, X-rayish phrases.”


"'Oh brave new world!' It was a challenge, a command."



"Livraram-se deles. Sim, é bem o modo de os senhores procederem. Livrar-se de tudo o que é desagradável, em vez de aprender a suportá-lo. É mais nobre para a alma sofrer os açoites do azar e as flechas da fortuna adversa, ou pegar em armas contra um oceano de desgraças e, fazendo-lhes frente, destruí-las... Mas os senhores não fazem nem uma coisa nem outra. Não sofrem e não enfrentam. Suprimem, simplesmente, as pedras e as flechas. É fácil demais".


“— É o segredo da felicidade e da virtude: amarmos o que somos obrigados a fazer. Tal é a finalidade de todo o condicionamento: fazer as pessoas amarem o destino social de que não podem escapar.”


"O Selvagem concordou inclinando a cabeça com tristeza. Em Malpaís, sofrera porque o haviam excluído das atividades comunitárias do pueblo, na Londres civilizada, sofria porque nunca podia fugir dessas atividades comunitárias, nunca podia estar sossegado e só".


O condicionamento para a morte começa aos dezoito meses. Cada petiz passa duas manhãs, todas as semanas, num hospital para moribundos. Lá encontram os brinquedos mais aperfeiçoados, e dão-lhes creme de chocolate nos dias em que há mortes. Aprendem, dessa forma, a considerar a morte como uma coisa banal.”


SINOPSE EM PORTUGUÊS


Uma sociedade inteiramente organizada segundo princípios científicos, na qual a mera menção das antiquadas palavras “pai” e “mãe” produzem repugnância. Um mundo de pessoas programadas em laboratório, e adestradas para cumprir seu papel numa sociedade de castas biologicamente definidas já no nascimento. Um mundo no qual a literatura, a música e o cinema só têm a função de solidificar o espírito de conformismo. Um universo que louva o avanço da técnica, a linha de montagem, a produção em série, a uniformidade, e que idolatra Henry Ford.


Essa é a visão desenvolvida no clarividente romance distópico de Aldous Huxley, que ao lado de 1984, de George Orwell, constituem os exemplos mais marcantes, na esfera literária, da tematização de estados autoritários. Se o livro de Orwell criticava acidamente os governos totalitários de esquerda e de direita, o terror do stalinismo e a barbárie do nazifascismo, em Huxley o objeto é a sociedade capitalista, industrial e tecnológica, em que a racionalidade se tornou a nova religião, em que a ciência é o novo ídolo, um mundo no qual a experiência do sujeito não parece mais fazer nenhum sentido, e no qual a obra de Shakespeare adquire tons revolucionários.


Entretanto, o moderno clássico de Huxley não é um mero exercício de futurismo ou de ficção científica. Trata-se, o que é mais grave, de um olhar agudo acerca das potencialidades autoritárias do próprio mundo em que vivemos. Como um alerta de que, ao não se preservarem os valores da civilização humanista, o que nos aguarda não é o róseo paraíso iluminista da liberdade, mas os grilhões de um admirável mundo novo.


SINOPSE EM INGLÊS


Far in the future, the World Controllers have finally created the ideal society. In laboratories worldwide, genetic science has brought the human race to perfection. From the Alpha-Plus mandarin class to the Epsilon-Minus Semi-Morons, designed to perform menial tasks, man is bred and educated to be blissfully content with his pre-destined role. But, in the Central London Hatchery and Conditioning Centre, Bernard Marx is unhappy. Harbouring an unnatural desire for solitude, feeling only distaste for the endless pleasures of compulsory promiscuity, Bernard has an ill-defined longing to break free. A visit to one of the few remaining Savage Reservations where the old, imperfect life still continues, may be the cure for his distress…